Muitas vezes, ao conversarmos com um leigo sobre o estudo de línguas clássicas como Latim e Grego, deparamo-nos com uma atitude defensiva, evasiva, que não raro toma a seguinte forma: “mas para que serve estudar essas coisas hoje em dia? Além do mais, eu nem tenho tempo pra isso!”
Mal sabe o nosso interlocutor — e mesmo que o digamos ele infelizmente já se terá aconchegado em sua concha pragmática, para além de quaisquer argumentos –, que existe, sim, serventia em estudar as línguas clássicas e, ainda melhor, sob um currículo clássico. E não pouca.
E o podemos mostrar, não só com argumentos abstratos, mas com exemplos, se quiserem, bem pragmáticos. O mais recente à disposição é o novo Primeiro Ministro britânico, Boris Johnson.
Por trás da persona descabelada, poucos imaginarão que se oculte um ex-professor de Latim. Mas assim é. Johnson ministrou aulas da língua dos romanos durante um ano em uma escola pública de elite na Austrália, após egressar do prestigioso colégio Eton, onde polira seus conhecimentos das letras clássicas.
Por seus méritos nessas matérias, o futuro primeiro ministro obteve uma bolsa de estudos para a Universidade de Oxford, justamente para um curso de Letras Clássicas. Nesse curso, ganhou tanta notoriedade que acabou eleito presidente da sociedade de debates de Oxford, a Oxford Union.
A esta altura o leitor já deve andar pensando consigo que um exemplo nada prova, o que é justo, mas não correto.
Não é correto, claro, porque não se trata de um exemplo apenas. E não é por acaso que o colégio que mais produziu primeiros ministros ingleses foi, justamente, o Eton, o qual ainda hoje se destaca por seu ensino das letras clássicas e por ter uma estrutura que retém certo aspecto da estrutura ideal, chamemos assim, platônica. Foram nada menos que 20 primeiros ministros formados lá. Isso para não mencionar os membros da atual realeza, os príncipes William e Harry.
Também David Cameron, premier durante 6 anos, é um etoniano. E, se não se destacou tanto no Latim quanto Boris Johnson, ao menos foi “punido” por ter fumado maconha nas dependências do colégio com a obrigação de escrever 500 frases em Latim. Uma punição com alto teor instrutivo.
Outro dado que pode dar alguma dimensão da importância do tema, é que a faculdade que Johnson cursou, conhecida por seu ensino clássico, por sua vez, produziu 4 primeiro-ministros britânicos, 5 laureados do prêmio Nobel e diversas figuras literárias de proa.
No mínimo, com esses exemplos, pudemos mostrar que o ensino clássico não faz mal a ninguém e, quiçá, ajude um tanto na formação pessoal, e até na vida profissional de quem o busca. A não ser que se contra-argumente que os cargos de primeiro-ministro britânico e os da realeza possuam baixos padrões de exigência…
Talvez, por fim, também seja necessário dar resposta àqueles que não querem saber dos padrões de exigência de ilhas remotas, como a de Inglaterra. Mas também aqui, em Terra Brasilis, as línguas clássicas figuram importantemente, embora não pareça. Mas basta lembrar de nomes como José Bonifácio de Andrada e Silva, Dom Pedro I, a Imperatriz Dona Leopoldina e seu filho, Dom Pedro II, todos os quais recipientes de uma educação clássica, e os pais fundadores do nosso país.
A esta altura, já podemos dizer: onde há fumaça, há fogo. Com tantos indícios, cremos ser inevitável que o objetor lá do início deste texto há de um dia sair de sua concha para perceber o valor desse lume afeito a plasmar inteligências, que é o estudo clássico.